domingo, 7 de maio de 2017

Conto: UMA NOVA VIDA

“A Vida só é possível reinventada.”- Cecília Meireles
“Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida.”- Jesus*


UMA  NOVA  VIDA

Eugénia passeia lentamente, à beira-mar... Perturbada ainda com o que lhe sucedeu há cerca de dois meses, saiu de casa, com o intuito de espairecer um pouco. Resolve sentar-se, momentaneamente, um pouco mais acima, na areia seca. Dá assim meia-volta, e vem para o lugar pretendido. O mar está esplêndido, com o radiante sol primaveril a brilhar, sem o obstáculo de qualquer nuvem.
Eugénia gosta imenso da Primavera. Tudo, nessa estação do ano, é renovação. Ela fica olhando para o mar por bastante tempo. Não há, na praia, senão uns escassos turistas, que nem sequer estão perto... Melhor assim! Nada interrompe os seus pensamentos.  Duas horas passam, assim, sem que ela dê por isso... As ondas, rasteirinhas, vêm morrer na areia, com o seu habitual ruído cavo, perpetuando a canção do mar. O sol refulge espectacularmente nas águas. Ao longe, alguém se aventurou num barquinho à vela, que, por momentos, se mantém ao alcance da vista, minúsculo e poético vulto triangular... Uma ligeira e agradável brisa remexe os cabelos negros, lisos e curtos de Eugénia...
Em que pensa Eugénia, tão absorvida?  Pensa que, efectivamente, aquilo que lhe têm dito várias pessoas, acerca do mar, bate certo com o que, agora, ela experiência: O mar, com todas as suas reconhecidas características, produz, na pessoa que junto a ele permaneça, por pouco tempo que seja, o salutar efeito de acalmar e ajudar a esvaziar a mente, ou até, meditar, inspirar-se... Quantas canções há, que falam do mar?! Quantos poetas sobre ele escrevem?! Quantos pintores o retratam?!
Nesses momentos, a paisagem marítima e os seus sons naturais falam-lhe de eternidade, continuidade, paz, beleza... falam-lhe de Deus, esse Deus para ela ainda um tanto desconhecido, Criador dessa Natureza no meio da qual ela se sente aliviada dos seus medos, mágoas, tristezas...
No meio da sua meditação, pensa ainda:
- Como será, vir aqui, de noite? Certamente, não deve cá vir ninguém! Quem se aventura, de noite, a chegar-se perto do mar? Só pescadores, certamente... E será que eles ainda partem, para a pesca, aqui da praia? Deve ser interessante passear ao luar, rente às ondas...
Mais calma, reflecte acerca do rumo a dar à  sua vida... Com vinte e nove anos, solteira, podia ter uma vida melhor... Mas, porém, dá-se agora conta de a que ponto foi ingénua, e demasiado confiante em quem tinha por perto... Podia ter evitado a situação em que se encontra actualmente... Bem diz o povo que “é melhor estar só do que mal acompanhado”!  Terá de ser cautelosa daí em diante, na forma de se relacionar com as pessoas à sua volta, para não voltar a envolver-se com ninguém que a possa ludibriar e prejudicar. Está aprendendo, a esse custo, uma dura lição!
Teve, até agora, duas opções, pela frente: partir daquele lugar, onde lhe aconteceram coisas desagradáveis, viajando para algum outro sítio, onde não seja conhecida... Onde possa encontrar paz... Ou ficar, e enfrentar, novamente, talvez, e com a possibilidade de insucesso, e consequentemente, de mais sofrimento, quem a levou à situação péssima a que chegou...
Experimentou, antes desses acontecimentos desagradáveis, tentar guiar-se pela religião de sua família. Encontrou, em si mesma, um vazio que os gestos  e práticas rituais não preencheram. Ela buscou em vários lugares,  em congregações diversas, uma resposta. Falaram-lhe de uma verdade que os comportamentos ao seu redor desmentiram... Ficou com pouca ou nenhuma vontade de se aventurar em congregações religiosas de qualquer espécie. Onde se encontra, então, a única, a autêntica Verdade? Certamente, não deve ser em nenhum desses lugares! Pareceu-lhe, há pouco, que a Natureza lhe queria falar dessa Verdade inefável, e notou que isso lhe adoçou, por algum tempo, a disposição... Dizia o célebre escritor português, Raul Brandão, numa das suas obras, e que Eugénia havia lido havia já algum tempo, que “talvez a poesia íntima, e ignorada, seja a mais bela, a que Deus escuta”1... Então, essa sinfonia das ondas, que ela escuta, ao passear e sentar-se à beira-mar, é poesia pura! Grandiosa! Eugénia sorri: É também a voz do Verdadeiro Deus a falar-lhe! Ainda lhe falta descobrir mais algumas coisas, para sentir-se liberta, pensa ela. Falta-lhe, também, e sobretudo, saber como expressar-se, diante dessa grandeza que a Natureza lhe revela...
Mas as coisas desagradáveis que lhe sucederam há pouco tempo levam-na a perguntar-se a si mesma: -Porque é que Deus não interferiu com algo, para impedir os acontecimentos que lhe provocaram tanta comoção? Porque teve ela que passar por experiências tão dolorosas e assustadoras? -Interroga-se  ainda Eugénia.
 Depois do vazio e frustração de uma religião que nada de bom lhe trouxe, a constante necessidade de encontrar paz interior  a levou a envolver-se  em outras práticas que, ao princípio, lhe  provocavam curiosidade... Foi assim adentrando-se  e familiarizando-se com ambientes como o de um terreiro  de  candomblé2, onde chegou a apanhar, em certa sessão, um valente susto: Há forças malévolas e superiores à do ser humano manifestando-se  nesses lugares...  E ela presenciou uma dessas manifestações por primeira vez na vida. Assustou-se realmente. Não gostou, obviamente, e quis ir embora... Não sentiu, por isso, paz, evidentemente, nem obteve qualquer resposta às suas grandes interrogações existenciais. Mas o companheiro, que estava lá com ela, forçou Eugénia  a assistir até ao fim, e quis depois, servir-se dela, para uma pseudo-sessão de espiritismo, já em casa, usando de violência: Ela negou-se a tal prática e revoltou-se. Ele agrediu-a. De tal forma que ela, agredida e posta de imediato, por esse companheiro,  na rua, da casa onde vivia com ele, foi parar ao hospital, com a bondosa e providencial ajuda de pessoas conhecidas, que iam passando na rua e se disponibilizaram de imediato em socorrê-la....
Depois da saída do hospital, passados alguns dias, Eugénia necessitou de tratamento psicológico, e de repouso absoluto, afim de recompôr-se das traumatizantes experiências vividas.
Abílio, esse seu temporário companheiro, foi  embora para  algum outro sítio. Desapareceu, sem deixar rasto, enquanto Eugénia  estava hospitalizada. Ela, por precaução,  preferiu e conseguiu, com ajuda de conhecidos, mudar de casa, após recuperar os seus pertences. Também foi aconselhada pelas autoridades, e por algum do  pessoal de serviço, no próprio hospital, a fazê-lo, e, se possível, ir embora daquela terra, sem revelar a ninguém o novo paradeiro. Isso, para despistar esse ex-companheiro que a maltratou.
Quanto ao seu trabalho, também teve de deixá-lo, e tendo tentado ficar de baixa, isso não foi aceite pela entidade patronal. Foi compulsivamente levada a rescindir o contrato que a ligava àquela empresa. Agora, quer dar um rumo diferente à sua vida, mas além do mais, teme o reaparecimento de Abílio. Já não quer voltar a vê-lo.  Sente  repulsa por ele. Sabe que ele foi indiciado pelas autoridades como indivíduo violento por aquilo que lhe fez,  e que a polícia  anda a procurá-lo. É natural, pois, que ele tenha fugido, ou, até, que se tenha escondido.
Quanto a ela própria, necessita, a longo prazo, de tempo de qualidade, a sós consigo mesma, para reencontrar-se, e tentar descobrir o que quer, ao certo, para a sua vida.
Eugénia sente-se, actualmente, de alma perdida, desorientada. Sabe que não se encontra em condições de ficar só,  e também, que precisa de ajuda, nesse momento difícil da sua vida. Sabe que não pode contar com a sua família. Os seus familiares repudiaram-na, por preconceitos e não aceitação da sua maneira de ser e de estar na vida. Deixaram, em seu coração, de contar para ela como o necessário apoio, como aquilo que deveriam ser. E apenas a proximidade da Natureza tem um salutar efeito sobre ela!
-Deus! Jesus Cristo! –Murmura Eugénia. -  Não te conheço devidamente, nem sei como falar contigo! Mas, se me ouves, por misericórdia, ajuda-me! Ajuda-me, Jesus! Será que me vais acudir? A quem mais vou eu pedir ajuda? Se não tenho ninguém!
Será que Jesus me ouviu?- Interroga-se ela. –Seria tão bom, se Ele me ajudasse!... Mas como vou saber a resposta a esse pedido? Será que Ele quer que Lhe falem como eu acabei de Lhe falar? De que maneira me poderia Ele ajudar? Ó Jesus! Onde estás? Acode-me, Jesus!- De joelhos na areia, mãos apertadas, em desespero, cabeça inclinada, de frente para o mar, ela fica, um longo momento, em atitude de espera...
Mas ao reerguer a cabeça, sente-se mais aliviada. Sente que o facto de ter implorado o auxílio divino a  aligeirou de alguma forma do seu fardo. Espera algo, não sabe bem o quê. Talvez obtenha alguma resposta... - pensa
 Apesar do seu sorriso de há pouco, agora, ao reerguer-se da areia branquinha, para regressar a casa,  e com o sol a pôr-se, há, todavia, nos olhos verdes de Eugénia, uma tristeza bastante notória, reflexo da grande mágoa que ainda lhe habita o coração...
Ao chegar a casa, Eugénia recebe, um convite, via telefone, de uma amiga, para ir passar uma temporada no campo. Esse convite já lhe havia sido feito cerca de um mês antes. Mas só agora é que ela se decidiu a aceitá-lo.  Ela percebe, de repente, que essa é a resposta de Deus à prece desesperada dela, de há pouco, frente ao mar!
- Obrigada, Jesus! Se esse convite é mesmo a tua resposta, ó Deus! Obrigada!- Agradece ela, subitamente animada. Algo novo, uma centelha de esperança, lhe faz bater o coração mais fortemente.   Felizmente, Abílio continua desaparecido. Ela se tem sentido perdida e desorientada, e tem tido também medo de ficar ali, na cidade, sozinha, sujeita ao reaparecimento, súbito e sem aviso, de Abílio, e a mais problemas. Com a aceitação desse convite, que lhe chega na hora certa, como um milagre, uma nova saída, um escape, ela tem a possibilidade de mudar de localidade, para bem longe, excluindo, assim, a hipótese de reencontros desagradáveis. Sabe que, lá onde Matilde vive, poderá ir passear, ter tempo para descansar o corpo e a mente, sem sobressaltos, meditar, e inclusive, fazer uma vida e uma alimentação diferentes.  E que todas essas coisas, juntas, a irão ajudar a curar-se física e mentalmente. Ela aceita, portanto, a proposta, de imediato. E parte, assim,  no dia a seguir, bem cedo, para a terra onde vive essa sua amiga, a Matilde, a cerca de  duzentos quilómetros de distância. Parte sem pena alguma do que deixa para trás. Nada mais a prende àquele lugar. Prefere procurar emprego, lá onde Matilde vive... Quem sabe, ela não arranja, por lá, algo em que goste de trabalhar, e possa assim ganhar a sua vida de modo mais agradável? Durante a viagem, Eugénia vai recordando como ela e Matilde se tornaram amigas, há alguns anos atrás... Apesar de Matilde ser mais velha do que ela, alguns anos, são muito amigas. Conheceram-se no Algarve, durante umas férias em que Eugénia e seus familiares se deslocaram ao sul do País, durante cerca de um mês. Matilde também havia vindo do centro do País, tal como eles, e ficara numa pequena vivenda, naquela localidade aprazível, sossegada. Na época, Matilde estava lá com familiares seus, na vizinhança mais próxima da casa que ocupavam Eugénia e seus pais e irmãos. Ali travaram conhecimento, e ficaram sendo amigas chegadas. Desde essa data, nunca mais deixaram de contactar uma com a outra. Quando não o fazem ambas por telefone, um postal, ou uma pequena carta, de ambas partes, mantém o seu contacto em dia. Para Eugénia, Matilde é como que uma sua irmã mais velha, com quem tem imensas coisas em comum.
Matilde é solteira, quarentona. Não muito alta, magrinha e vivaça. Usa roupas de estilo jovem, garridas, ao seu próprio estilo, não convencional. Dona de um sorriso rasgado e constante, é comunicativa e alegre. Tem cabelos encaracolados, castanhos aruivados, que usa agora semi-curtos, e uns olhos castanhos expressivos. Vive actualmente sozinha, nessa mesma pequena vila do interior, no meio da serra algarvia... Trabalha por conta própria, numa sua pequena loja de artesanato. Trata-se de uma pessoa extremamente positiva, dinâmica, sempre bem disposta, amiga de ajudar quem necessita... Quando Eugénia ali chega, algumas horas depois, e desce do autocarro, tem a amiga à espera.
- Até que enfim! – diz Matilde, sorrindo abertamente, e abraçando de imediato Eugénia, efusivamente. - Lá te decidiste, Geninha! Fizeste boa viagem?
-Um pouco cansativa, mas correu tudo bem! A hospedeira da camioneta foi  impecável comigo! Uma pessoa muito simpática!
- Ora, ainda bem! Deves vir com fome, suponho!
- Comi umas sandes na camioneta, e bebi uns sumos, mas agora, já tenho alguma fome, novamente, confesso!
- Ora, bem! Daqui a pouco, vais jantar comigo, pois já tenho o jantar feito.  Depois, descansas à tua vontade!
Vão andando, e rumam à sua casa, não muito longe dali. Quando lá chegam ambas, Eugénia  é muito bem recebida, com carinho e simplicidade. Matilde guia-a pela casinha humilde adentro, mostrando-lhe cada peça.
-Anda ver o teu quarto, e deixar lá as tuas coisas! Aqui, como vês, é a cozinha, com esta salinha ao lado. E cá está o corredor, e o acesso aos quartos. Aqui é a casa de banho, e já te preparei tudo o que é preciso, para tomares um bom banho, se e quando o desejares!
- Obrigada, Matilde! Tu és impecável!
-  De nada! E o teu quarto é este!- diz Matilde, sorrindo e abrindo, de facto, uma das portas, naquele pequeno corredor. Um típico quarto campestre, decorado de forma rústica e simples, mas alegre, surge diante dos olhos de Eugénia. Ela sorri também, ao ver um lindo e singelo ramo de flores do campo dentro de uma pequena jarra de loiça antiga, sobre uma pequena cómoda. Um pormenor amoroso, de que ela não estava à espera.
Eugénia sente-se, de repente, como se estivesse em sua própria casa, nessa pequena mas acolhedora divisão da casa da amiga. Sente um à-vontade que há muito não experimentava, nos vários lugares onde habitara... Uma sensação reconfortante.
- Ó Matilde! Como te poderei agradecer tudo o que estás a fazer por mim? Eu já andava a sentir-me perdida... Se não fosse o teu convite, feito de novo, confesso que não sabia onde me metesse, nem o que fizesse!
- Ainda bem que falámos ao telefone! Eu tive um palpite de que te deveria voltar a convidar para vires cá passar uma temporada! Estava, e ainda estou, a precisar de um pouco de companhia!
- Foi um palpite excelente! Na hora certa! Acho que foi a resposta d’Ele à minha súplica aflita de ontem à tarde! Obrigada, mais uma vez!
- O melhor agradecimento que me podes dar, é ficares por cá o tempo que te apeteça, e pores-te boa totalmente! Mas penso que deverias agradecer principalmente a Deus! Ele é que me deu esse palpite!
- Também acho! Agradeci-lhe  logo assim que me convidaste! Mas eu e Deus não somos propriamente muito chegados... Eu nem sei orar a Ele como deve ser... Há coisas, na religião, que me fazem muita confusão... Mas que Ele me ouviu, lá isso, não há dúvida!
-Pois falaremos de todas essas coisas nas nossas conversas, menina! Estou aqui eu, somos amigas, e posso ajudar-te a esclarecer todas as dúvidas que tenhas...
-Tu és religiosa, Matilde?
- Não! Eu sou crente em Deus!
-E não é a mesma coisa?
- Não! Já reparaste que não há quadros com imagens religiosas aqui em casa? E nem imagens de escultura!
- Realmente, não vejo cá nada disso!
- Pois não, porque eu não faço uso disso! Não preciso de imagens para adorar a Deus! Isso é religião, e eu apenas sou uma seguidora de Jesus Cristo, uma discípula d’Ele!
- Ah, bom! Assim, já gosto mais! E como sabes o que fazer, como orar, como adorar a Deus, a esse Deus, esse Jesus de que me falas?
- Em primeiro lugar, devo dizer-te que leio a Bíblia! Através dela, Deus fala à minha consciência, ao meu coração e ao meu entendimento!
- A mim, acho que Ele me fala através da Natureza!
- Sim! Também a mim! É bom que já tenhas essa sensibilidade, para que Ele te fale através da Natureza! Mas, quando - e se - quiseres, arranjar-te-ei uma Bíblia, para que possas lê-la, e instruir-te-ei como fazê-lo de modo correcto!
- Agradeço! Pois nunca ninguém me ajudou com isso!
- Vá, Geninha! Anda lá, então, jantar, que enquanto comemos, continuamos a conversa... Mas, não queres, agora, tomar primeiro um banho?
- Não! Fá-lo-ei de manhã, se não te importas! Hoje estou mesmo cansada!
 As duas amigas estão agora na cozinha e Matilde põe sobre a mesa uma frigideira cheia de ovos mexidos com tomate, e outra com cogumelos grandes, salteados... Tudo acabadinho de fazer! Um odor apetitoso invade o espaço de refeições. Uma larga tigela transparente, contendo uma salada de rúcula fresca com maçã, laranja, e frutos secos, acompanha os restantes ingredientes. Uma bela refeição campestre, para elas. Depois, para sobremesa, um doce caseiro, preparado por Matilde. Enquanto se sentam e se preparam para comer, Eugénia repara numa gatinha cinzenta tigrada, muito linda, que vem ter com Matilde, e a quem esta última faz festas e fala com voz de mimo. Depois, apresenta a gata a Eugénia:
- Esta é a Pérola! A minha bichinha de estimação!
- Tão linda! Vejo que também gostas de gatos, tal como eu!
- Adoro! Se gostas de gatos, estarás de bem com ela! Ela sente quando gostam dela, sabes?
- Claro! Os animais sentem essas coisas! São tão intuitivos, os gatos!
-Por isso mesmo é que gosto tanto deles! Também são uma das mais belas criações de Deus!
- Concordo!
- Olha, ó Geninha: antes de comer, se não te importas, vamos agradecer a Deus por esta refeição!
- Certo!
Matilde fecha então os olhos, baixa reverentemente a cabeça, e Eugénia olha-a, atenta, em silêncio. Nunca viu ninguém fazer tal coisa. Mas o respeito por esse momento, e pela sua amiga, a faz permanecer calada, enquanto Matilde ora, em voz audível:
- Senhor Deus, Pai Celestial, agradeço-te pelos alimentos que me permitiste pôr sobre esta mesa, e pelo facto de poder partilhá-los com a minha amiga Eugénia, aqui presente, ó Pai! Agradeço-Te, também, pela sua companhia, nesta hora, e por todas as Tuas Bençãos, e o Teu Amor, ó Pai! Abençoa esta refeição, Senhor! Amén.
- Amén! – Concorda Eugénia, maravilhada com a simplicidade e abertura de espírito com que Matilde dirigiu a Deus a sua prece. Ela própria, até àquele momento, só ouvira preces complicadas, repetidas de modo mecanizado, papagueadas de forma vazia, sem convicção. Ou ladainhas longas e sem graça, cheias de repetições... Agora, acabou de ouvir Matilde falar com Deus, como se, de facto, fosse alguém a falar com seu próprio pai. Matilde apercebe-se da surpresa de Eugénia e pergunta-lhe, sorrindo:
- Que foi? Porque estás assim tão surpresa? Nunca ouviste ninguém orar a Deus?
- Dessa forma tão directa e tão simples, nunca! Só ouvi ladainhas cansativas e rezas repetitivas, sem sentimento, que para mim, não faziam nenhum sentido!
- Ainda bem que não faziam nenhum sentido, porque é para não fazerem mesmo! Deus já te permitiu chegares a essa conclusão e isso é bom! Assim, vais certamente, e depressa, aprender como Deus gosta que oremos! Com as nossas próprias palavras, com o que nos sai do coração!
- Ena! Ainda agora aqui cheguei, e já estou a receber várias informações que, para mim, já são respostas a perguntas que fazia a mim mesma, há muito tempo!
- Que bom, Geninha! Que bom!
A refeição decorre animada, entre as duas amigas... Ambas conversam sobre o tema que ocupa a mente de Eugénia:
- Disseste que tinhas a Bíblia. Podes emprestar-ma?
- Vou mesmo dar-te uma, se quiseres. Era de uma familiar minha que aqui viveu. A ela devo o facto de ter-me tornado crente em Jesus há vários anos. Ela havia de ficar contente por eu ta oferecer. Pelo menos, essa Bíblia ainda seguirá sendo útil!
-Aceito! Mas vou precisar de orientação para começar a lê-la...
- Não te preocupes! Eu dou-te umas dicas, que a mim também me foram dadas. Assim, vais ver que lhe vais tomar o gosto. Se quiseres, lemos juntas, nas primeiras vezes, para ires-te habituando ao manuseio da Bíblia!
-Boa ideia! Aqui é um bom sítio, calminho, para aprender... Sem pressas e sem ninguém a interferir.
-Exactamente! E os únicos horários a respeitar cá em casa, são os das refeições, e o deitar e levantar. Esses horários ajudar-te-ão, tal como me ajudam a mim, a ter uma sã disciplina de vida! Verás! Faz-nos bem!
-Acredito! Tu tens um belo ar saudável!
Depois da refeição, arrumam rapidamente a cozinha, entre as duas, e ficam sentadas, ao pé da  lareira acesa, porque as noites ainda são frescas ali naquela zona, e naquela época do ano. Ali se mantêm, ambas, por algum tempo, conversando.
Matilde trouxe, para aquele espaço, a prometida Bíblia, e ensina Eugénia a utilizá-la de forma metódica. Começam por explorar o índice, e consultar uma passagem do “Evangelho Segundo S. Mateus”3. Finalmente, as coisas começam a fazer sentido para Eugénia. Matilde oferece-lhe aquela Bíblia, e um caderno novo, afim de que a amiga possa fazer anotações, durante a leitura.
Espantada, Eugénia descobre, durante esse serão, que a famosa oração “Pai-Nosso” está integrada num relato bíblico, e é, afinal, um exemplo e modelo de oração facultado por Jesus aos seus discípulos3. Afinal, não é apenas mais uma reza monótona, para papaguear! Fica feliz por analisar esse trecho e concluir que cada palavra desse exemplo de oração tem um alcance e um significado profundos, que deveriam ser meditados a preceito.
Como, apesar de todo o interesse por ela  manifestado, em relação ao tema que debatem, Eugénia dá mostras, já, de bastante cansaço, Matilde resolve parar a lição bíblica.
- Amanhã, voltaremos a pegar nesse tema!- Promete ela, sorrindo. - Vejo que te interessa bastante, mas esse assunto tem “pano para mangas”! Fico, desde já, feliz de ver como encaras todo este ensino! Mas estás muito cansada e tens tempo para ires aprendendo! Será melhor, agora, ires já descansar!
Matilde repara, também, que, durante aquela entusiástica conversa, Eugénia abriu o caderno e fez algumas anotações, que lhe mostrou:
Data, tema escolhido, referências bíblicas, versículos bíblicos. Inclusive, ela copiou o texto da oração, escrevendo como cabeçalho:
«“Pai-Nosso”: Modelo de oração – como nos devemos dirigir a Deus, nas nossas orações.»
Matilde aprova, satisfeita: a amiga está já bem encaminhada. Para um primeiro contacto com o Livro Sagrado, deu um passo enorme, avançou bastante.
Eugénia dorme melhor, nessa noite, do que em meses seguidos, alguma vez, conseguiu... O sossego daquele lugar; as energias positivas daquela casa; daquele quarto acolhedor; a segurança de estar agora a salvo de más surpresas; a satisfação das descobertas acerca da Palavra de Deus; Todas essas coisas trouxeram- lhe a paz suficiente para dormir maravilhosamente.
No dia seguinte, acorda cedo, sentindo-se fresca e repousada. No espelho da casa de banho, vê o seu rosto, já sem olheiras. Sorri para si mesma, e mete-se no banho, cantando, coisa que também há muito tempo não fazia. A vida de Eugénia está literalmente a mudar da noite para o dia.
Vestida com roupas simples e confortáveis, como é seu costume, dirige-se à cozinha, onde Matilde já se encontra, preparando coisas para o pequeno almoço de ambas.
-Então, amiga, que tal dormiste?
- Maravilhosamente!  Até cantei no duche, vê lá tu!
- Eu ouvi-te! Eh! Eh! Eh! Fico feliz de te ver assim, bem-disposta, fresquinha, alegre! Dá gosto ver a tua mudança!
- E a mim, sabe-me tão bem sentir-me assim!
- Queres vir comigo, um pouco, agora, à minha lojinha?
-Sim! Quero! Tenho curiosidade de ver o que lá vendes...
- Artesanato produzido por mim, e por outros artesãos daqui...
-E isso vende bem?
- Razoavelmente! Eu consigo viver disso! Sou a única a ter uma loja destas, cá! Ao princípio, tive de investir algum do meu dinheiro, é claro! Mas agora, já recuperei algum desse capital...
-Eu vinha na viagem pensando que talvez fosse bom eu procurar trabalho cá por estas bandas...  Assim, cortava de vez com aquele ambiente de onde estive, e com a possibilidade  de aquele idiota me voltar a molestar! Achas que consigo?
Matilde olha para Eugénia, aprovando com um sinal afirmativo de cabeça, e tendo uma ideia súbita, expõe-a de imediato, espontânea como é:
- Ouve lá, ó Geninha! Diz-me uma coisa: -Gostas de artesanato? Se soubesses produzir algo artesanal que desse para ser vendido na minha loja, podias trabalhar comigo! Acaba de me ocorrer esta ideia!
- Se gosto? Adoro artesanato! Há que tempos que não faço nada dessas coisas! Mas sei fazer costura, aprendi a fazer bonecos de pano, em tempos... Poderia fazer alguns engraçados!
-Olha, isso era fantástico, se conseguisses voltar a fazer alguns!... Eu tenho máquina de costura... facilitava-te! E na biblioteca local, há alguns livrinhos ensinando a fazê-los... Podemos ir lá, requisitar até três livros, copiar alguns modelos básicos, e moldes, para te orientares inicialmente, e depois, fazes os bonecos com sobras de tecidos que cá tenho, dos meus próprios trabalhos,  lãs, e outros preparos... o que gostares mais!
- Boa! Assim que pudermos, então!
Já na lojinha, Eugénia fica encantada com a simplicidade de tudo o que lá encontra. Mas nota que, realmente, não há bonecos de pano ali, à venda. O que Matilde fabrica, são malas e sacolas em todo o tipo de tecidos. Matilde explica também que a sua loja é a única do género, e ninguém, que ela tenha conhecimento, produz nenhuns bonecos de pano, na vila, por enquanto. É a oportunidade de Eugénia que surge, assim, de trabalhar em algo de que gosta, sem nenhuma concorrência.
Matilde liga o seu aparelho leitor de CD, tendo introduzido um CD com temas antigos de Roberto Carlos. Começa-se a ouvir então uma música sobejamente conhecida do famosíssimo cantor, falando de Jesus: “Ele está p’ra chegar”4.
Eugénia reage acompanhando a canção que conhece bastante bem, cantando um pouco do refrão ela mesma. Matilde sorri.
Eugénia comenta:
- Até a música Deus está a usar, para falar comigo! É espantoso! Obrigada, meu Deus! Obrigada, Jesus!
Matilde responde:
- Sim! Deus usa a música também, amiga! O Senhor tem inúmeros recursos para tratar connosco! Creio que isso é um sinal inequívoco de Deus, Geninha! Aqui tens a proposta  de um caminho a seguir!  De um trabalho para fazer! E de que gostas! Mas, só se quiseres, pois Deus não força ninguém, e nem eu te imponho nada! És livre!
- Deus fala  e responde-nos de forma estranha, mesmo! Mas, no entanto, maravilhosa, Matilde!
- Sim! É verdade! Deus conhece-te bem, porque te criou. Ele sabe do que gostas, o que necessitas para a tua vida, o que te pode fazer feliz! Só precisas de entregar-lhe a tua vida, e deixar que Ele cuide de ti, à Sua sábia maneira! Deus quer que tu sejas feliz, porque Ele te ama, Geninha!
- Falas com tanta convicção, que estou a acreditar no que dizes! Porque também estou comprovando que, realmente, Ele se importa comigo, e me está a ajudar muito, nos últimos dias!
- Claro que sim! Vamos a isso, então?
- Vamos!
Assim, as duas amigas associam-se a partir daquele dia, no trabalho artesanal, cuja preparação lhes ocupa, inicialmente, duas ou três manhãs, por semana, em casa. De tarde, Matilde e Eugénia vão até à loja, durante um par de horas, e depois, se necessário, vão às compras juntas, regressando então a casa, para preparar a sua refeição da noite, que comem, enquanto conversam e fazem planos entre as duas. Depois, durante cerca de duas horas, dedicam-se, cada noite, ao estudo e leitura da Palavra de Deus, lendo a Bíblia, e escrevendo Eugénia as suas anotações, tirando dúvidas... Matilde responde conforme sabe e conforme o que ambas encontram registado na Bíblia.
Eugénia aprende, nessas meditações, que Deus não nos dá espírito de medo (temor), mas sim de fortaleza.5 Compreende, assim, que o medo que antes sentiu era algo oriundo das trevas em que viveu mergulhada, antes de começar a ler a Palavra. Numa dessas primeiras noites, depois de jantar, Eugénia faz, com a ajuda de Matilde, uma oração sentida, de entrega de sua vida a Jesus Cristo, recebendo o Senhor em sua vida, como  Senhor e Salvador pessoal. Nessa mesma noite, Eugénia tem um sonho em que vê Jesus, e em que Ele lhe fala. Ao acordar, recorda perfeitamente o sonho, contando-o a Matilde.
-Jesus está mesmo a cuidar de ti, e a chamar a tua atenção!- Replica Matilde ao ouvir o relato desse sonho de Eugénia. –Digo-te mais: não foi um sonho!
- Não? Então? Como  o sabes?
- Foi algo real, só que o Senhor aproveitou um momento específico de receptividade da tua mente,  e do teu espírito, entre o sono profundo e a vigília,  o qual é designado por “estado alfa”6, pelos especialistas,  e esteve contigo, nesse momento, falou-te de maneira que pudesses lembrar-te disso!
-Sabes tantas coisas, Matilde! Como consegues?- Diz Eugénia, sequiosa de conhecimento, olhando para a amiga com olhar ansioso.
- Leio bastante! E a leitura é uma prática que, bem orientada, nos ensina muito! Ando a estudar o funcionamento da mente humana. As coisas que já descobri esclarecem-me muito, em relação a fenómenos como esse, desse suposto sonho teu!
- Deve ser uma questão de saber que livros ler, certamente...
- Sim, claro! Podes ler qualquer um dos que se encontram na estante da salinha! Tens ali bastante escolha. Desde livros de auto-ajuda, de que eu própria já necessitei, há tempos atrás, a livros de psicologia, se gostares do tema, e livros de meditações evangélicas, ou católicas carismáticas, entre outros... Alguns desses livros são realmente uma benção! Também ali tenho alguns que são relatos de testemunhos marcantes, que nos edificam realmente!
-Combinado! Deitarei uma olhadela, e começarei pelo que mais me desperte a atenção! Obrigada!
Eugénia assim faz, e passa, então, a ter, na cabeceira, livros para ir lendo todas as noites, ou em momentos do dia em que lhe apeteça fazer uma pausa... Inclusive, tendo-se inscrito como leitora na Biblioteca local, traz, de vez em quando, algum que lhe agrade.
Apesar de colaborar com Matilde, na produção de artesanato para a loja, ela tem a liberdade  de tirar, de vez em quando, um tempinho só para si. Matilde sabe quão fraco ainda é o equilíbrio psicológico de Eugénia. Não a força, por conseguinte, a fazer seja o que fôr. Está ali para ajudar a amiga, e sabe que na sua missão em relação a Eugénia, ainda tem bastante que fazer. Porém, a nível oficial, e para ajudar a amiga a resolver questões práticas, ofereceu-lhe o trabalho de colaboradora, e fez-lhe um contrato de part-time, relativo a esse trabalho. É um trabalho remunerado oficialmente, com todos os aspectos legalizados.
Aconselhou também a amiga a mudar de número de telemóvel, afim de que ninguém a aborreça com chamadas indevidas, principalmente aquele ex-companheiro que pode lembrar-se de a molestar novamente...
Eugénia seguiu o conselho de Matilde, e mudou de cartão e número de telemóvel, sentindo-se, assim, mais descansada em relação a esse assunto.
Assim passam alguns meses, em que a companhia  e ajuda de Matilde são preciosas para Eugénia.
A mudança de ambiente também foi salutar. Eugénia já não parece a mesma. Inclusive, ao dedicar-se ao seu novo trabalho, fez, para si mesma, por gosto, uma linda boneca de pano, de tamanho suficiente para se ver bem,  e que depôs sobre a cama.  A boneca tem os cabelos encaracolados, castanhos, apanhados no topo por um lacinho do mesmo tecido estampado de flores  do vestido que ostenta,  os olhos risonhos, castanhos, também, e um lindo sorriso. Chama-se Tilda, em homenagem a Matilde. Há muito que Eugénia sonhava fazer isso, e conseguiu-o na perfeição, com a ajuda da máquina de costura de Matilde, e o aproveitamento de materiais que sobejam dos artesanatos têxteis desta.
Uma manhã, à mesa do pequeno almoço, Matilde está a conversar, a respeito dessa mudança, com Eugénia:
- Estás tão diferente de quando aqui chegaste, Geninha! Até ganhaste algum peso, tens melhor aspecto, agora! Bravo!
-Graças a ti, Matilde! E graças a Jesus!
-Sobretudo graças a Jesus, e à tua decisão acertada de vires para cá!
-Só Deus, mesmo, podia ajudar-me desse modo maravilhoso! E utilizar-te a ti, que considero, actualmente, como mais do que uma amiga! Tornaste-te a irmã que eu nunca tive, e a família que substitui a minha família consanguínea!
- Como dizia a saudosa escritora Fernanda de Castro, “os amigos são a família que escolhemos”!7
- Sem dúvida, Matilde! É uma grande verdade!
-Queres continuar por cá, Geninha?
- Quero pois!
- Estás à vontade, então! A tua companhia tem sido preciosa para mim!
- A tua também o tem sido para mim!
- Mudando de assunto, Geninha: Já pensaste em orar ao Senhor, no sentido de te ajudar a perdoar os teus familiares, e tentares voltar a contactá-los?
- Penso muitas vezes nisso! Mas é tão difícil perdoar, Matilde!
-É mesmo! Ninguém diz que é fácil, realmente! Custa muito, por vezes! Mas lembra-te do modelo de oração do Pai-Nosso, Geninha! Devemos perdoar, para sermos perdoados!
- Bem sei!
- Ora ao Senhor sobre esse assunto! Bem sabes que Jesus não nega ajuda a ninguém!
- Tens razão, Matilde! Fá-lo-ei!
-Lembra-te de um pormenor, Geninha: Falta de perdão, mágoas, ressentimentos, são, na nossa vida, como lastro excessivo e inútil num barco. E esse lastro é mesmo prejudicial, em certas ocasiões da nossa vida! A vida de cada ser humano é como uma travessia de um rio ou de um mar, e há que saber quando largar, borda fora, o lastro excessivo, e retirar assim o peso, o fardo que impede o barco de navegar mais facilmente!
-Gosto da forma como explicas as coisas! É tremenda!
- É Jesus que me inspira a forma de falar, e  o que dizer, quando é preciso, Geninha!8
-Graças a Deus! Agradeço a Jesus por ter-te como amiga, e pela tua preciosa ajuda! Sem ti, onde é que eu estaria?
-Apenas faço a vontade do meu Mestre! E gosto de poder ser útil!
- Do nosso Mestre! Agora, eu também já sou discípula de Jesus!
- E eu  fico feliz por tudo isso! É gratificante ver o resultado da minha obediência a Jesus, actuando na tua vida! E o resultado da tua disposição em mudar de vida e querer aceitar o domínio de Jesus sobre ti!
- Eu estou muito feliz, Matilde! Nunca pensei que a minha vida poderia mudar tanto e de eu vir a ser tão feliz como sou actualmente!
Eugénia vai, a pouco e pouco, por meio de oração e atitude humilde diante de Deus, conseguindo uma feliz mudança em seu viver. Perdoou e contactou os seus familiares, que, a princípio, estavam duvidosos sobre a modificação sofrida por Eugénia. Mas, algum tempo depois, foram-se convencendo da realidade: Eugénia telefona-lhes. Envia-lhes fotos suas, da loja de Matilde onde continua a trabalhar. Dos seus trabalhos, que estão a obter bastante sucesso. Das feiras em que participam ambas. Fala-lhes de Jesus, a quem deve essa grande mudança. Em troca, eles mostram-se satisfeitos, e dão-lhe, inclusive, a notícia de que Abílio foi apanhado, finalmente, pela polícia.  Está preso, desde há pouco tempo, tendo usado de violência contra outra mulher, que também o denunciou às autoridades.
-Falta-te perdoar em teu coração, a essa pessoa! – Diz-lhe Matilde, quando Eugénia lhe transmite a notícia recebida.
-Perdoar? Mas mesmo que ele saia da prisão, nada mais quero com ele!
- Claro que não, Geninha! Mas vais ver que te vais sentir mais leve! Deus manda-nos perdoar os nossos inimigos, e aqueles que andam vivendo desordenadamente. Mas não devemos, sequer, voltar a acompanhar com eles, mas sim desviar-nos! Porém, ao perdoar, estamos a ficar mais limpos de coração, e isso agrada a Jesus!
- Dessa maneira, sim, de acordo! Que Deus me ajude a perdoar e esquecer o Abílio!
- E deverias orar, ainda,  para que a vida dele se modifique! Quem sabe, na prisão, ele não tem uma oportunidade de mudar?
- Achas mesmo?
- E porque não? Não sei se sabes, mas há pastores e missionários, que vão periodicamente visitar os presos, e pregar-lhes a Palavra de Deus, tocando assim nas consciências dessas pessoas. E alguns convertem-se mesmo!
-Ainda bem para eles!
-O principal, aqui entre nós, e no que te diz respeito, é que tu própria tenhas já o coração aberto aos ensinamentos de Deus, e  a disposição para os pôr em prática! Isso faz toda a diferença em ti, na tua personalidade, na tua maneira de estar na vida, na tua felicidade!
-Abençoado o dia em que aceitei Jesus como Salvador!
-Amén!
E assim, Eugénia mudou de vida, e segue sendo feliz, vivendo ainda,  e colaborando, com Matilde, como irmãs em Cristo, e como artesãs profissionais. De vez em quando, Eugénia recebe a visita de familiares seus. Fizeram as pazes com ela. No entanto, para seu próprio bem, e de acordo com eles, ela não pretende voltar à terra onde vivia antes. Mas, junto de Matilde, nessa pequena vila do interior da Serra Algarvia, está em paz, e segue aprendendo, como discípula do Senhor Jesus.


FIM
Notas:
* Ev.S. João, cap.14, vers. 6 – (Biblia Sagrada, Novo Testamento, Ed. Revista e Corrigida de João Ferreira de Almeida).
 1) Extraído da obra “Os Pescadores” de Raul Brandão.
2) O candomblé é uma religião de origem brasileira/africana.
3)Ver o Ev. S. Mateus, cap. 6:1-18 (Biblia Sagrada, Novo Testamento, Ed. Revista e Corrigida de João Ferreira de Almeida).
4)“Ele Está P’ra Chegar”- Tema de Roberto Carlos.
5) Ver a 2ª Epístola de  S. Paulo a Timóteo, cap.1, vers. 7 (Biblia Sagrada, Novo Testamento, Ed. Revista e Corrigida de João Ferreira de Almeida). “Deus não nos tem dado espírito de temor, mas sim de fortaleza, e de amor, e de moderação.”
6)Conforme  nos diz Lauro Trevisan em “O Poder da Mente”.
7)Fernanda de Castro, em “Ao Fim Da Memória”.
8) Inspiração dada por Deus, para falarmos aos outros: Ev. S. Mateus, cap.10, vers.19, 20. (Biblia Sagrada, Novo Testamento, Ed. Revista e Corrigida de João Ferreira de Almeida)

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